sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Um pouco de história parte II


No mesmo forum SCP, e do mesmo user Chirola mais um resumo histórico e um breve sumário de algumas situações, que contribuiram para a letargia que se vive actualmente, e que em seguida passamos a transcrever:

"O esplendor do Grande Sporting,dominador,opressivo,esmagador,começou a perder-se com a morte de António Ribeiro Ferreira.
Embora os que o sucederam,Góis Mota(53/56)e a seguir Cazal-Ribeiro(56/59)tivessem transitado de dentro das suas direcções e fossem figuras da mais alta estirpe e determinantes na conduta dos destinos do Sporting,a verdade é que,sem o líder,sem o timoneiro,já não era a mesma coisa. É que o Sporting,com Ribeiro Ferreira,estava habituado a ganhar sempre.

Em 1959 foi eleito Brás Medeiros,que mais tarde e ainda miúdo tive oportunidade de conhecer. Esteve lá 2 anos e a seguir veio Gaudêncio Costa outros 2 anos. O Sporting que tinha sido campeão em 57/58 voltava a ser campeão em 61/62.

Nestes tempos o Sporting era um Clube com fortes ligações ao Estado Novo e naturalmente ao Prof. Dr. Oliveira Salazar.
Dentro das suas direcções estavam sempre personalidades afectas ao regime e das quais faziam parte inclusivamente prestigiados membros da União Nacional,da Legião Portuguesa e da Polícia de Intervenção da Defesa do Estado.
O ambiente que se vivia e o ar que se respirava no Clube era tranquilo,era sereno,era pacífico. Apenas se exaltavam os princípios e os valores do Sporting. Tudo era natural.

Entretanto em 1961 começa a Guerra no Ultramar Português e o Sporting e os Sportinguistas,decidiram colocar na Presidência militares. Oficiais-Generais.
Comodoro Joel Pascoal(62/63),Brigadeiro Sá Viana Rebelo(63/64) e General Homem de Figueiredo(64/65).
Excelentes militares,excelentes homens,excelentes Sportinguistas,mas sem muito jeito para estar à frente do Sporting e sem muito jeito para as coisas do futebol. Não ganhamos nenhum campeonato,mas ganhamos a nossa única Taça Europeia. A Taça das Taças.

As coisas iam andando,mas o fulgor e a pujança de outrora estava-se a esbater e a nível interno começavam-se a complicar.
Brás Medeiros regressa à Presidência em 1965 e mantém-se até 1973.

Foram anos difíceis. O Sporting estava a ser demasiado conotado com o regime,demasiado politizado e por isso injustamente castigado e boicotado.
Estava-se a fechar dentro de si mesmo e a perder terreno. Havia problemas financeiros(sempre houve)e no futebol a euforia tinha passado para outro lado. Havia mesmo um proteccionismo escândaloso a esse outro lado e uma perseguição ao Sporting a todos os níveis.
Os tempos infelizmente estavam a mudar.

Brás Medeiros era acusado em ambientes restritos de ser um pouco brando,muito político e um bocado forreta. De não ter a garra e o pulso de outros. De estar a deixar que outros nos ultrapassassem e nos passassem a perna.

Lembro-me por exemplo que para comprar Yazalde foi preciso utilizar um estratagema,porque Brás Medeiros não queria gastar dinheiro.

Sorin que era o Director do Futebol foi à Argentina para ver o Yazalde no Independiente,porque Vitor Santos(Tio do Rui Santos) director da Bola,mas grande Sportinguista,lhe teria dito que estava ali um grande jogador e em final de contrato.
Quando Sorin o viu ficou encantado. E pensou que não se poderia perder aquele fora de série.
Mas tinha um problema. O jogador era mais caro do que o que se tinha falado,havia outros clubes interessados,entre eles o River Plate e,como é que ia convencer o Presidente,que era forreta.
Foi então que se lembrou do seguinte estratagema.

Telefonou para o Vice-Presidente e Director Financeiro Abrantes Mendes(pai) e disse-lhe que estava ali um jogador extraordinário,que o Sporting não podia perder. Só que era um pouco mais caro do que pensavam.
Abrantes Mendes disse logo que não podia,que era muito dinheiro e que isso só com ordem do Presidente.
Então,Sorin disse-lhe que tinha acabado de falar com o Presidente e que ele lhe teria dito que estava tudo bem,desde que ele(Abrantes Mendes)dissesse que havia possibilidade de arranjar essa verba.

Abrantes Mendes ficou sem fala e Sorin atacou dizendo que não se podia deixar passar aquela oportunidade,que era um jogador fantástico e que se não o comprassem seria um tremendo erro.
Em face disto e a muito custo,mas como havia autorização do Presidente,disse que sim.

Imediatamente a seguir,Sorin telefonou para o Presidente. Explicou-lhe que o Yazalde era realmente uma truta e disse-lhe quanto custava.
Aí, Brás Medeiros disse:
__ O quê? Nem pensar. Não temos esse dinheiro. Está fora de questão.
__ Não diga isso,Sr.Dr. não diga isso. Já falei com o Abrantes Mendes e ele disse-me que caso o Sr.Dr. autorizasse,ele arranjava o dinheiro. Não podemos perder esta oportunidade.

__ Ele disse isso? Mas...mas é muito dinheiro. Podemos...?
__ Podemos. O que não podemos é deixá-lo fugir. E o River Plate não o larga. Amanhã vão falar com ele. Posso tratar de tudo? Posso telefonar ao Abrantes Mendes e dizer que está tudo bem? - Pergunta Sorin.

__ Bom...se é assim...pode.


Já não era preciso.


Mas não estava em causa o Sportinguismo. O Sportinguismo continuava-se a viver e a sentir por toda a Família Leonina.
Não havia desconfianças,não havia negociatas. Não havia infiltrados. Não havia emergentes. Não havia cá gente que não fosse do Sporing. E todos serviam o Sporting.
Os directores sentavam-se nos seus lugares na Bancada dos Cativos Vitalícios junto dos outros sócios. E havia Presidentes que também era para aí que iam. Não iam para a tribuna. Iam para o seu lugar de sócio. Foi aí precisamente que os conheci a quase todos.

Havia óptimo ambiente. Os sócios socializavam,tinham salas dignas,eram bem tratados. Respirava-se Sporting.

Todos no Sporting sabiam bem quem era o inimigo. Estava bem identificado. Nem sequer lá entravam. As relações estavam cortadas. Como deve ser.

Por acaso,da última vez,com Brás Medeiros, não foi bem como deve ser.
Eu explico.

No princípio dos anos sessenta as relações institucionalmente não estavam cortadas. Mas era como se estivessem,porque era implícito. Era como se fizesse parte dos estatutos. Nem eles iam a Alvalade,nem nós íamos ao campo deles. Estou a falar de dirigentes,claro. Entre adeptos o relacionamento também era péssimo,como convém.

Aí por meados dos anos sessenta o Sporting na pré-época costumava ir fazer uns jogos ao Brasil e depois fazia o jogo de apresentação com uma dessas equipas brasileiras. Quem tratava disto era um empresário brasileiro,que já trabalhava com o Sporting há alguns anos e com quem tinha óptimas relações. Para além dos jogos,tratava dos hotéis,dos transportes,de tudo. Era sempre assim.

Até que houve um ano em que o Sporting não foi porque ia disputar um torneio em Espanha.
Mais tarde veio-se a saber que quem ia ao Brasil eram...os porcos-lampiões. Com o mesmo empresário.
Ora,como havia grande confiança e até amizade com o empresário brasileiro,o Vice-Presidente do Sporting não foi de modas e fez aquilo que qualquer Sportinguista que se preze faria.

Pegou no telefone e ligou ao Zé Carioca.

__ Olha lá,então vais receber aqueles fdp?

__ Aaaah...Cês não vem...é só esti ano Dôtô. É Só esti ano.

__ Bom... vê lá isso. Mas trata-me mal esses gajos pá. Esses gajos são do piorio.

__ Deixe comigo Dôtô...deixe comigo.


O que aconteceu foi que os porcos-lampiões estavam no auge e o rei do tremoço era cabeça de cartaz. Tinham uma máquina de propaganda montada e quando chegaram distribuiram fotografias,autógrafos,galhardetes,panamás por todo o lado e claro,encheram o Caiçara com uma data de lixo. Para além disso,levavam uma legião de jornalistas e aquilo eram jantaradas e borracheiras todos os dias. O presidente deles na altura dizia que dia sem apanhar uma tortachada não era dia e já se vê que aquilo para o Dorivau era sempre em festa.
Umas noites acabavam todos a cantar,outras todos a rir e outras todos a chorar. Mas sempre abraçados e sempre grossos.

Perante tudo isto e com a carteira cada vez mais cheia o Jozimar descoseu-se e contou o que o vice-Presidente do Sporting lhe tinha dito.

Resultado. Utilizaram a informação,aproveitaram os jornalistas,fizeram-se muito ofendidos e cortaram relações.

Da parte do Sporting,não houve grandes reacções porque aquilo era como chover no molhado. Relações com aquela gente já não havia desde sempre,por isso foi para o lado que dormiram melhor.



No final do seu mandato em 1973,Brás Medeiros já evidenciava claros sinais de cansaço. Já era de certo modo contestado,por membros da direcção e o clube não conseguia inverter o ciclo de ganhar 1 campeonato de 4 em 4 anos.
Ocupou interinamente o seu lugar Manuel Nazareth,que tinha sido Médico Analista de Salazar e que era uma pessoa muito simpática e de que todos gostavam. Havia que marcar eleições e até lá ficava Manuel Nazareth.

Criou-se um certo vazio. Confesso que se sentia algum desalento. Alguma ansiedade. Era preciso que o Sporting mudasse.
Era preciso que o Sporting fosse mais forte. Muito mais forte. Havia falta de dinheiro. Mas não havia ladrões.

A equipa de futebol tinha alguns problemas de balneário. Havia patrões dentro da equipa. Dizia-se que eram eles que faziam a equipa. Outras vezes dizia-se que era o Manuel Marques. Os treinadores não se impunham. Os dirigentes não tinham pulso. Os resultados não apareciam.

Apareceu João Rocha.
Era para se candidatar a presidente do Vitória de Setúbal e curiosamente também foi o seu amigo Vitor Santos(Tio de Rui Santos) que lhe disse que no Sporting ia haver eleições e que ainda não havia ninguém destacado e aquilo estava um bocado confuso.

Candidatou-se. Ganhou. Ficou lá 13 anos.

Rocha não vinha de dentro do Clube e não era uma figura conhecida no Sporting. Foi visto com alguma desconfiança sobretudo pelos antigos dirigentes.
Vinha com muitas ideias,com inovações,mas sobretudo era um homem ambicioso.

Cedo se viu que as suas direcções eram ele e os outros. Tinha um feitio complicado,mas não há dúvida de que mexeu com o Clube(a colectividade,como ele dizia). Havia grande mobilização.

A equipa estava a fazer uma época fantástica. Yazalde pintava a manta e os adeptos iam com a equipa para todo o lado.

Veio o 25 de Abril.
O país entrou em auto-gestão e o Carnaval passou a ser todos os dias.

Mesmo assim o Sporting é campeão,faz a dobradinha e só não ganhou a Taça das taças por grande infelicidade. Foi eliminado nas meias-finais pelo Magdeburgo que viria a vencer a prova,porque Yazalde não jogou.

O Clube só volta a ganhar o campeonato 6 anos depois, 79/80(em comissão directiva)e pela última vez com Rocha em 81/82(também em comissão directiva). Rocha ficou até 1986. Nunca conseguiu devolver o Clube às vitórias.

Se é verdade que no princípio Rocha foi uma lufada de ar fresco com muitas iniciativas e muitos sonhos,muitos deles torpedeados pelos Governos(Mário Soares),também é verdade que quando saiu deixou o Clube abandonado e muito descuidado.
Mas também não deixa de ser verdade que quando entrou não se lhe conhecia fortuna e quando saíu esta era enorme.
O Sporting,continuava sem dinheiro...

Quando Amado de Freitas o substituiu e quando foi confrontado com a situação económica do Clube,disse que nunca tinha imaginado que era assim. Amado de Freitas era o Director Financeiro da Direcção de João Rocha...

Pelo meio houve muitas peripécias,muita instabilidade,muita suspeita,muita polémica.
Os últimos anos de Rocha foram muito maus e não deixou saudades. Pensava eu.

Mas tudo isto e embora não me peças, também podíamos acrescentar quem veio a seguir,Jorge Gonçalves e depois Cintra,não tem qualquer comparação com a "Era Roquette".

É verdade que houve más Direcções. É verdade que houve péssimos Presidentes. É verdade que o Clube continuou sem ganhar.

Mas durante todos esses anos,com todas as deficiências que houve,com todas as contrariedades que houve,com todos os erros que houve,com todas as asneiras que houve,NUNCA,mas NUNCA houve défice de Sportinguismo.

Nunca houve em circunstância alguma falta de Sportinguismo.
Nunca os adeptos e os sócios estiveram desavindos.
Nunca os adeptos e os sócios puseram em causa o Sportinguismo de quem os dirigia.
Nunca os dirigentes desprezaram e desconsideraram os adeptos e os sócios.
Nunca houve debandada por parte dos adeptos e dos sócios.

Em contraponto,com a maldita "Era Roquette" e com o seu criminoso mentor,cometeram-se os maiores atropelos,as maiores tropelias,as maiores afrontas aos Sportinguistas e ao Sporting.

Poderiam até não ganhar,poderiam até não conseguir inverter o rumo,poderiam até falhar,como falharam,poderiam até roubar como outros roubaram,MAS ROUBAR O SPORTING AOS SEUS ADEPTOS E AOS SEUS SÓCIOS,É QUE NÃO TEM PERDÃO.

Fomentaram a Des-Sportinguisação do Clube,provocaram a debandada geral dos adeptos e dos sócios,promoveram a cultura dos vencidos. Acabaram com o Sporting.

Nunca lhes perdoarei."

1906

Luta & Resiste!

2 comentários:

Anónimo disse...

Queria aqui deixar os meus parabens pelo magnifico texto que o senhor escreveu,é com textos assim que me fazem sentir o amor pelo meu clube e que ainda ha pessoas a lutar pelo nosso SPORTING CLUBE DE PORTUGAL!

Anónimo disse...

Pois é...
Concordo plenamente, mesmo nos 18 anos que passámos sem ganhar nada (os anos que eu me recordo) nunca o Sporting se afastou dos seus adeptos, nunca deixou de haver entusiamo e fervôr clubísta, nunca, mesmo com erros, nos deixámos de orgulhar da nossa grandeza... nunca... até agora, deste que o dito Roquette (e seus indefectíveis seguidores) começou a pensar em levar o Sporting para à sua esfera de empresas (e olhem os camabalachos que esse senhor anda metido há uma data de anos)